sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Triathlon e os pequenos prazeres da vida


Trote leve fofocando com os amigos

Pisar o chão descalça depois de correr

Contar piada no treino de pedal as 5:00 da manhã

Falar palavrão no treino de pedal

Soltar 100m livre

200m de perna com nadadeira conversando em 3 na mesma raia

Ter um amigo nadando no teu ritmo na raia ao lado só pra te fazer companhia

Sentir o sono vir e poder dormir

Acordar no pique total numa manhã de verão

Banho quente depois de um pedal gelado

Coca-cola gelada depois de um pedal quente

Primeira respirada profunda na bike, depois de uma natação tensa

Nadar no mar

Massagem

Tricotar com as amigas no vestiário da academia

Padoca com os amigos depois do treino

Pão francês fresquinho com manteiga e café no lanche da tarde

Lanche de churrasco com queijo na estrada voltando da competição

Comer um prato GG de macarronada no jantar

Pegar vácuo numa roda boa

Sentir a endorfina entrar na corrente sanguínea durante a corrida

Matar o treino de pedal da madrugada e dormir mais 2 horas babando

Ver o sol nascer no treino de pedal da madrugada

Perceber que alguém te esperou para dar roda e voltar para o pelotão

Esperar alguém que sobrou e levar de volta para o pelotão

Fazer xixi na roupa de neoprene antes da largada

Tirar a roupa de neoprene

Não conseguir parar de colocar itens nessa lista

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Poesia de uma tarde de inverno


Deixei as palavras brotarem para não estourar a represa e canalizei através do triathlon, como ele é meu esporte de coração, achei que era um veículo nobre.

A água nas mãos
Deslizando os braços
Esticando o alcance
Abrindo espaços

O vento no rosto
É o vento na alma
O vento no corpo
Balançando a calma

Os pés no chão
O passo ligeiro
A energia de dentro
É o prazer inteiro

Não vejo a linha
E não importa que eu passe
Pelo contrário, espero
Que o caminho me ultrapasse

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Bastidores do triathlon



Parte 2: O Menu

Se o treino ou a competição vão durar até 2 horas, nada que 2 sachês de gel (1 a cada 45 min) e 1 garrafinha de água não resolvam. O triathlon na distância short e olímpica dificilmente ultrapassa esse tempo. A não ser que seja uma prova com requintes de crueldade, tipo os XTerra ou os XTreme da vida, aí sim lá se vão mais de 2 horas fácil. Portanto, eu diria que quem compete até a distância olímpica ainda mantém o glamour ao comer, é relativamente clean e seguro (no sentido de não causar distúrbios alimentares) consumir apenas o gel com água.

Agora quando vamos analisar o que o triatleta de longa distância consome nos seus seguidos treinos de mais de 3 horas de duração, principalmente na bicicleta, aí a imaginação corre solta. Principalmente porque comer as mesmas coisas toda semana enjôa, daí que estamos sempre "trocando figurinhas" uns com os outros e o menu começa a ficar bem "tabajara". Eu acho que já falei em algum post anterior que triatleta não pode ser fresco. Pelo menos os de longa distância não.

Imagina como fazemos para transportar toda a comida? Clean não é. Delicado não é. Bonito aos olhos e apetitoso não é. Geralmente usamos um "Bento Box" (veja definição no dicionário da minha amiga Claudia) na bike e uma pochete na corrida (além dos bolsos das camisetas e shorts). E detalhe: não costumo lavar o Bento Box sempre não...duvido que alguém faça isso regularmente!

Montei uma lista de "comidinhas" que já experimentei nos treinos e nas competições, coloquei tudo no formato de menu à la italiana, pelo menos nisso, no formato, manteremos o glamour. Devo informar que as combinações dos itens nem sempre funcionam, às vezes é necessário ter em mente duas das "10 dicas que Lance me ensinou": 8-Diarréia: volte para casa assim que posível e 9-Flatulência:fique no final do pelotão. Mas isso a gente só descobre experimentando. Ou não.

Buon appetito!


Antipasti
- Palitinhos assados salgados (Stiksy)

Primo
- Batata cozida só no sal
- Massa de lasagna cozida com sal e enroladinha
- Purê de batata no saquinho de gelinho

Secondo
- Bisnaguinha com requeijão light e peito de peru

Contorno
- Barrinha de proteína
- Gel

Formaggio e frutta
- Banana prata
- Laranja
- Gomos de mexerica

Dolce
- Bananinha com açúcar
- Bananinha com cobertura de chocolate
- Bisnaguinha com geléia
- Mocotó (bicolor rosa e branco)
- Confeitos de gelatina (variados sabores e formas)

Caffè
- Gel GU sabor cappucino com o dobro de cafeína

Digestivo
- Coca-cola

Bebidas
- Água
- Endurox R4
- Accelerade
- Gatorade
- Água com maltodextrina

sábado, 13 de agosto de 2011

10 dicas importantes que o Lance Armstrong me ensinou



Há tempos que quero sair do silêncio aqui no Tripateta, até já escrevi a continuação para a série “Bastidores do Triathlon” mas não encontrava tempo nem disposição para revisar o texto e postar. Agora com o 70.3 de Penha se aproximando, e portanto descansando mais nos finais-de-semana, peguei para ler o livro “Lance Armstrong- Programa de Treinamento” que ganhei há uns 2 anos e ficou na estante. Senti uma necessidade incontrolável de compartilhar ensinamentos grandiosos que encontrei neste pequeno compêndio, verdadeiras pérolas de sabedoria, escrito por um tal de Joffre Nye, “ghost writer” de Chris Carmichael e Lance Armstrong. Tenho cá comigo a certeza de que Adriana Oliveira, a tradutora, também deve ter contribuído para que as pedrinhas de conhecimento se tornassem pérolas cintilantes.

Então vamos lá, no meu formato preferido de lista inversa de importância, separei com carinho 10 dicas que achei imprescindíveis para qualquer ciclista que se preze, lá vão!

10- “Os rolos de treinamento são os melhores amigos dos ciclistas dedicados. Lance os utiliza para vários propósitos”
Tripateta: Uau! Eu tenho um amiguinho para os dias de chuva! Estou dentro!

9- “Por mais confortáveis que possam ser para Lance ou Chris, os shorts de lycra de ciclismo não agradam a todos, pois deixam “tudo à mostra””.
Tripateta: Opaaaaa! Deixam tuuuuudo a mostra?

8- “Aquecedores de braço podem ser guardados nos bolsos da camiseta quando não estiverem sendo usados”
Tripateta: O “aquecedor” é um conjunto de fios que vai pelo braço né? Tipo aquelas mantas elétricas? Dica boa essa.

7- “Uma técnica para enfrentar curvas é conhecida como fora/dentro/fora. Desloque-se para fora em direção à beira da sua pista. Passe pela curva em uma tangente dentro dela. Depois da curva, deixe o impulso levá-lo para fora, para a beira da pista. Então imediatamente volte para o lado direito da estrada, para sair do fluxo do tráfego”
Tripateta: Oi?

6- “Lance aprendeu a técnica de pressionar o lado interno do joelho contra o tubo superior de seu colega de equipe inglês Sean Yates”
Tripateta: Ou o Lance tem as pernas longas pra caramba ou isso já tá ficando meio que proibido para menores.

5- “As colinas não são todas iguais”
Tripateta: Essa vou escrever num post-it e colar no meu guidão quando estiver treinando numa subida de 2% de inclinação para fazer uma de 10% na competição.

4- “Todos os campeões compartilham o dom de manter rigidamente um foco; eles podem ligá-lo ou desligá-lo.”
Tripateta: Só uma dúvida: se desligar o foco, como, ou melhor, onde fica?

3 - “Seja mais esperto que seu cérebro”
Tripateta: No comprendo.

2- “Como lidar com disfunções alimentares. Diarréia: volte para casa assim que possível”
Tripateta: Sem comentários.

E finalmente a dica mais importante do livro...

1- Como lidar com disfunções alimentares. Flatulência: reduza a quantidade de alimentos ricos em fibras e fique no fim do pelotão para o conforto de seus companheiros.”
Tripateta: E acenda um incenso! Pelamor!

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Bastidores do triathlon



Parte 1: O carro

Nadar, pedalar e correr, tudo na sequência, no mesmo evento, quase sem descanso entre uma modalidade e outra. Requer treinos diários, geralmente 2 modalidades por dia. Treinar triathlon, trabalhar, ter tempo para família e amigos e morar numa cidade caótica como São Paulo é quase um milagre. Mas existe uma parcela de obsessivos neuróticos e disciplinados que consegue, nem sempre da forma, digamos , mais limpa. Apesar de todo o charme da tecnologia das bikes, dos aparatos, do equilíbrio muscular, das cores, da aura apolínea do triatleta, existe um outro lado bem menos glamuroso. Não sei o que se passa com os triatletas de outras cidades, que talvez tenham algumas facilidades, como ir para o treino a pé, de bike, nadam no mar, etc, mas vou abrir o jogo e contar alguns detalhes sórdidos dos bastidores do meu esporte aqui em São Paulo.

A começar pelo carro. Para ser triatleta aqui, com o mínimo de segurança e pontualidade, é preciso ter carro. A cada treino, a cada competição, a gente “chucha” um monte de coisa lá dentro e nunca consegue tirar tudo. Eu não coloco a mão debaixo do meu banco sem olhar antes.

Caramanhola (garrafinha) é uma beleza, rola pra tudo quanto é lado no chão do carro. E se estiver com restos de maltodextrina ou Endurox então só rola uma vez pra baixo do banco e gruda, deixando um rastro de lesma brilhante pelo tapete de borracha. Uma vez eu achei uma caramanhola antiga no porta-malas e tinha um ser vivo morando nela. Joguei no lixo sem pensar duas vezes, antes que a tampa se abrisse e saísse uma garra asquerosa lá de dentro. Por outro lado, outro dia, estava na musculação e o treinador me deu uma bronca porque eu não estava me hidratando. Retruquei dizendo que tinha esquecido a garrafinha. Ele deu risada e me falou: “Ah vá, carro de triatleta sempre tem uma caramanhola debaixo do banco do passageiro, na parte de trás, aposto que tem uma no seu.” Não dei o braço a torcer: “Tem nada! Meu carro é organizado!”. Quando fui embora, só por curiosidade, procurei em baixo do banco. Ela estava lá. Felizmente tinha só um resto de água e coloquei novamente debaixo do banco, nunca se sabe quando vai precisar...

Uma coisa é certa: não dá pra ser triatleta e fresca (o). Se é fresca (o) não é triatleta de verdade, deve fazer “teatro”. Porque pensa bem, pegar o saquinho com roupas sujas do treino da manhã que ficou o dia todo dentro do carro, às vezes sob altas temperaturas, abrir no final do dia pra lavar é um ato de coragem. Isso quando a gente lembra de levar o saquinho, porque senão elas ficam todas emboladas no chão, atrás do banco do motorista, deixando um olor agradabilíssimo, praticamente um pout pourri de rosas e alfazema, que você sente ao abrir a porta do carro e quase cai pra trás. Coitado do manobrista, se o carro fica em um estacionamento. No meu estacionamento eu chego e já vou avisando: “Ó, tem gato morto aí dentro hoje hein? Melhor deixar os vidros abertos!” .

Tênis eu já cansei de lavar, dá muito trabalho e gasto muito tempo. Agora, depois dos treinos longos de corrida, aqueles em que a gente sua bastante e os tênis ficam encharcados de suor, eu simplesmente os coloco no sol pra secar. Depois uso de novo. Sol. Suor. Sol. E por aí vai. Só lavo mesmo se estiverem (bem) enlameados ou se a presença deles dentro do meu carro for notada antes mesmo do treino. Ainda bem que os pés ficam longe do nariz quando a gente corre!

Agora, tem uma coisa estranha que acontece, um fato inexplicável, acho que é um “poltergeist”. Um fenômeno paranormal. Uma, e somente uma luva de ciclismo quase sempre muda de lugar sozinha e vai para uma parte desabitada do carro. Por mais que eu verifique. Por mais que coloque tudo juntinho. Uma fica lá dentro. E quando eu descubro, valha-me meu Nosso Senhor do Couro Podre, é um cheiro peculiar. Só ela. Sozinha. Pequenininha.Tem um futum que vou dizer. Luva de ciclismo deve ter mesmo um segredo porque quando ela começa a ficar velha, não adianta lavar mais, nem deixando de molho na cândida. Só botando fogo e exorcizando a coisa ruim!

Mas não é sempre que a gente acorda de manhã e sabe exatamente o que vai conseguir treinar durante o dia (leia-se aqui antes do trabalho, na hora do almoço ou depois do trabalho). Ciclismo não tem jeito pra mim, ou é de madrugada ou é bike no rolo. Mas natação, corrida e musculação são sempre incógnitas. Então carrego de tudo um pouco no meu possante. Nele quase sempre se encontrará : 1 par de tênis, 1 maiô, 1 óculos de natação, 1 touca de natação, 1 toalha, 1 conjunto de corrida (top, meia, camiseta, shorts), 1 gel, 1 bananinha Paraibuna. Bobeou a gente dá aquela escapadinha pra correr no parque no final do expediente ou faz meia-horinha de musculação antes de ir pra casa.

Eu poderia falar do banco do carro no pós-treino, mas sou bem precavida quanto a isso, cuido bem dele porque depois eu preciso sentar no mesmo banco com roupa de trabalho limpa e cheirosa, apesar de o cinto de segurança, às vezes, ficar úmido (ainda não resolvi essa questão) então sempre levo uma toalha e acabei de comprar uma capa de banco especial. Muito boa. A minha tem até estampa de flores pra dar um quê delicado num mundo tão rude. Mas esse não é o padrão não, em geral o banco dos carros dos triatletas é deplorável, já ouvi manobrista (que é cabra macho sem frescura nenhuma) reclamando do cheiro e de ficar com as costas e a poupança molhadas de suor alheio.

Hoje peguei carona para almoçar com amigas triatletas e personal trainers. Tinha uma bola de treino gigantesca "sentada" ao meu lado e outras coisas que não consegui enumerar, de tantas. Se a bola estava no banco traseiro, não quero nem imaginar o que teria no porta-malas...

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Olhando para dentro

Um dos maiores erros que os atletas competitivos de esportes individuais cometem no dia da prova é prestar mais atenção fora do que dentro, me explico: fora = tudo aquilo que acontece ao seu redor, os outros atletas, seu computador de pulso, GPS, Cateye, velocímetro, cronômetro, as condições climáticas, os torcedores, enfim, tudo o que não é você. Dentro = tudo aquilo que se passa no seu interior, no seu corpo, suas percepções, seu calor, sua sede, sua fome, seu cansaço, sua vontade, seu humor, enfim, seus sinais vitais do corpo e da mente.

Se estamos falando de esporte individual, isso significa que você só pode contar com você. Vou usar o triathlon como exemplo porque é meu esporte, mas isso se aplica a outros esportes individuais de endurance. Posso olhar o velocímetro da minha bicicleta na prova e ver que está abaixo do esperado, acelero mas não percebo que me desgasto demais com isso. O que vai acontecer? Uma hora vou pagar o preço, seja na corrida em seguida, seja numa lesão, seja numa doença logo ali, e digo isso com propriedade porque já passei por tudo, já quebrei na prova, já me lesionei, já tive uma trombose em 2009. Muitas vezes treino com um pessoal que é extremamente dependente do GPS, tanto na corrida como no ciclismo. De repente a pessoa fica o tempo todo olhando o GPS para manter o ritmo. Fico inconformada, não é possível que não consiga sentir o esforço. Penso comigo: joga esse treco fora! Presta atenção no teu esforço que você ganha mais! Eu tenho um GPS mas uso mais para marcar as distâncias, olho poucas vezes o ritmo.

A primeira vez que meu Cateye (velocímetro da bicicleta) morreu numa prova bateu desespero. Ferrou! Pensei. Mas fazer o quê? Saí pedalando. Conforme foi passando o tempo, eu ali, só sentindo meu esforço, comecei a gostar da coisa. Fiz um trato comigo mesma: vou manter um ritmo em que a perna não queime e eu não fique muito ofegante, mas também sem moleza, sem “passeio no parque”. Terminei o pedal bem, saí pra correr inteirona. Ano passado em Pirassununga o Cateye morreu de novo, nem me abalei, pelo contrário, respirei fundo e comecei a olhar pra dentro. Terminei a prova debaixo de 34C e sol no lombo sem cãimbras, feliz da vida.

Bem, ser dependente dos brinquedinhos tecnológicos nem é o maior mal não. O que pega mesmo é ser dependente dos outros! O que meu adversário está fazendo, o que ele treina, o que ele come, o que ele descansa, eu lá vou saber! Tem gente que até treina escondida. Eu sei o que eu fiz, o que eu treinei, o que eu bebi, o que eu comi, o que eu descansei. Esse domingo teve Triathlon Internacional de Santos, um calor dos infernos, umidade alta. Já quebrei nessa prova de terminar com a vista escura abraçada ao bebedouro de Gatorade. Esse ano pus na cabeça que eu não iria olhar em volta, não iria olhar quem estava na minha frente nem quem vinha vindo atrás. Na corrida, coloquei um tapa olho, feito burro de carga mesmo: enterrei minha viseira e olhei pro chão (com isso fiquei menos interativa, desculpem amigos), só prestando atenção nas sensações. Tive altos e baixos, quis parar porque o calor era brutal e sufocante, os 10k pareciam 20k. Mas era só a mente, o corpo estava bem hidratado, respiração controlada, sem dores, diminui um pouco o ritmo e fui em frente.

Quando o calor é muito forte e o esforço é grande a gente não pode tomar muita água de uma vez senão o estômago não absorve e dói na região do abdomen, não pode deixar de tomar para não entrar em desidratação profunda, não pode jogar muita água gelada na cabeça porque senão molha o pé e faz bolha, não pode deixar de se resfriar senão a pressão cai. Tá fácil né? Imagina tomar conta disso tudo e ainda dos outros? Dá não. Mas funcionou, eu terminei muito cansada mas terminei me sentindo bem, alguém gritou para mim no finalzinho da corrida: você é a segunda mulher amadora a terminar. Ótimo resultado, mas sinceramente? Pra mim, minha maior vitória nesse domingo, foi comigo mesma, controlar todas essas variáveis internas, curtir a competição e terminar bem é o meu desafio e o meu troféu.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Você treina o quê?!


Sempre que começo a conviver com um novo grupo de pessoas o assunto esporte não tarda a surgir. Seja pelas mãos de um prato de comida saudável, pelo tônus muscular ou pelas mãos de uma prosaica camiseta de competição, as pessoas, cedo ou tarde perguntam se eu sou atleta e quando respondo que faço triathlon o espanto é unânime: “você treina o quê?!”. O triatleta que ainda não recebeu em troca um “você faz teatro?” é apenas questão de tempo e de oportunidade.

O que se segue após esse contato inicial é mais ou menos um “ahhhh bem que eu percebi que você tem um porte atlético”. Se o diálogo parasse aí eu já consideraria meu dia ganho. Mas a avalanche de perguntas começa, na maioria das vezes nessa ordem, como uma pedrinha que vai descendo a encosta da intimidade abaixo e vai agregando cada vez mais neve e se transformando numa imensa massa de gelo destruidora: “você treina quantas vezes por semana?”, “que horas você treina?”, “aonde você treina?”, “quantas horas você dorme?”, “o que você come?”, “você trabalha?”, ”a que horas você entra no trabalho?”, “que horas você namora?” e finalmente a fatídica: “você tem vida social?”.

Adoro responder cada pergunta e sempre acho que meu estilo de vida “triatlético”, na verdade, pode influenciar positivamente as pessoas. Seja lá no que for. Se a pessoa parar para pensar na quantidade de gordura que ela ingere uma vez naquele dia já tá valendo. Se ela pensar “pô, se essa maluca faz tudo isso eu também posso fazer pelo menos uma caminhada no domingo” pra mim é a glória nas alturas amém.

Mas existem os casos bizarros. Em 2008 fiz uma maratona em Amsterdã. Após a maratona aproveitei para passear pelos países próximos. O primeiro destino seria Berlim, de avião. Sentei na minha poltrona na janela e eis que uma “porta” de 2 m x 2m senta-se ao meu lado: um americano gigantesco, forte e gordo. Fiquei espremida na janela, praticamente desapareci ali no meu canto. Mas não satisfeito em me sufocar fisicamente, desembestou a falar sem parar, me contou que era fisioculturista e estava voltando a treinar, estava indo visitar uns parentes na Alemanha e era de Connecticut. No único momento em que me foi permitido falar, contei que tinha ido fazer uma maratona e que tinha ido fazê-la porque eu queria completar o Ironman no ano seguinte, eu era triatleta. Ele ficou eufórico: “GET OUTTA HERE!!! YOU TRAIN TRIATHLON? GET OUTTA HERE! YOU'RE KIDDING?” . Resumindo a história, ele me deu uma aula de nutrição, sono, descanso, treinos, periodização, me deu uma barra de proteína enorme para comer naquele momento porque eu não poderia ficar mais de 3 horas sem comer e me deu mais uma de reserva pra qualquer eventualidade. Eu só abri a minha boca apenas mais duas vezes: para comer a barrinha que, diga-se de passagem, era muito boa e para agradecer.

Outro dia uma nova amiga, do curso de francês (“que horas você estuda?”) me fez umas perguntas mais práticas, ela veio com um: “e me fala da logística, como que você faz pra treinar tão cedo: as suas roupas, toalha, mochila, apronta tudo no dia anterior? E a toalha molhada, dá tempo de secar pro outro dia?”, “Você leva a roupa do dia pra academia ou volta pra casa pra se trocar?” . É mágica, a gente faz mágica. Montar a mochila de treino do dia seguinte é chato, levo pelo menos 1 hora. Não posso esquecer nada e, no final do dia, ou seja, instantes antes de montar a mochila do dia seguinte, tenho que tirar todas as coisas sujas e molhadas dela, deixar de molho, botar pra secar. E o glamour? Cadê o glamour de ser triatleta? Ficou de molho na cândida, junto com a meia cheia de graxa e lama do treino de pedal de hoje cedo.

Brincadeiras à parte, só dá pra enfrentar todo o perrengue que é treinar triathlon amando muito esse esporte. Eu sou fã, leio revistas, entrevistas, assisto DVDs, etc, e acho que posso influenciar as pessoas a levarem uma vida mais saudável pela vida que levo. Então, respondendo: não, não faço teatro, nem na vida nem no esporte, encaro de frente e de verdade.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Off-season, S.Silvestre e travessias

Depois de um período grande de descanso, eis que amanhã recomeço com saudade os treinos de triathlon. Meu off-season teve 6 semanas de duração. Devo dizer que curti cada momento dele, cada preguicinha, fiz tudo o que eu queria e minha consciência está leve como uma pluma.

São Silvestre: emoção, água-benta e Brigadeiro

No meio do meu off-season fiz alguns trotes leves de corrida apenas para não sofrer muito na São Silvestre. Essa foi a minha quarta. Teve a palhaçada da medalha que foi entregue no kit, antes da corrida. Um desrespeito com o corredor e com a própria prova, tão tradicional e famosa no Brasil todo. Bem, felizmente, apesar dos esforços do pessoal da Yescom (os desorganizadores da prova) em descaracterizar nossa tão querida prova, ela foi maravilhosa e o foi por conta dos participantes, tanto corredores como espectadores. O tempo ajudou, o sol se escondeu e a temperatura ficou amena. Na largada tava todo mundo lá: Homem-Aranha, A Noivinha, Mulher Gato, Ayrton Senna de macacão e capacete, o índio descalço e de cocar, o Homem Prateado, o Cavaleiro Medieval e sua armadura de ferro, o pessoal de Cerquilho, Tiririca Cover, o Homem Camarão, Penélope Charmosa, Rogério Ceni, o Homem das Cavernas, eu, amigos da Planet Assessoria, todos alinhados. Não, essa não é a descrição de um quadro do Salvador Dalí, é a nossa São Silvestre!

Emoção

Com aproximadamente 45 minutos de prova, ouço o pessoal que estava assistindo nas ruas :”O Marílson ganhou! Foi brasileiro quem ganhou a prova! O Marílson ganhou, vamos correr com mais força!”. Eu me senti como se estivesse no final da Segunda Guerra e as pessoas estivessem gritando nas ruas que a guerra tinha acabado e os aliados eram vencedores. Foi muito emocionante porque todo mundo batia palma e gritava de alegria. Foi assim por alguns quilômetros.

Água-benta

Então cheguei nas ruazinhas residenciais da Barra Funda, pensando comigo se eu teria, como nos anos anteriores, a “água-benta” jogada com esguicho pelas donas de casa. Elas costumam colocar uma escada na frente da casa e, do último degrau, jogam água nos corredores, aliviando o calor. Cheguei na Alameda Olga e lá estavam elas, sem falta. Na rua Margarida tinha mais. Fiz questão de passar sob algumas gotas e fazer pensamento positivo, nesse momento um senhor gritou: “olha a água-benta!!!”. Ainda agora estou na dúvida: será que ele leu meu pensamento?

Brigadeiro

Comecei a subir a Brigadeiro em terceira marcha, logo joguei a segunda, cansada, e fui subindo, olhando pro chão. Subi com 2 corredores que me acompanharam, corredor de rua sabe, na hora do aperto a gente procura alguém num ritmo próximo e vai dando força um pro outro. Passamos o viaduto da rua 13 de Maio, a subida apertou mais um tiquinho, o motor tossiu, joguei a primeira. O pessoal que me acompanhava também. Chegamos na av Paulista, plana, agora é acelerar, mas e as pernas? Perdi em alguma esquina da Brigadeiro, não sei qual. Só sei que chegamos com a alma e com um sorriso no rosto, todos juntos, batendo palmas e desejando feliz 2011 para todos ao redor. Enquanto fui caminhando para a dispersão, outros corredores chegaram e fizeram questão de me desejar bom ano, disseram que me viram subindo e que se prometeram que se eu não andasse eles também não andariam. Olha a responsa! Demos muitas risadas.

Travessias

Quero encerrar esse post compartilhando com vocês um texto do Fernando Pessoa que recebi e achei muito interessante para refletirmos nesse início de ano:

“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”

Que tenhamos muitas travessias em 2011!